Hernandes F Carvalho
Professor Titular da Unicamp e Presidente da Federação das Sociedades de Biologia Experimental (FeSBE)
Um governo não escolhe que parte do país vai governar. Assume-o como um todo, inclusive os erros dos governos anteriores.
O editoral “Capes e a lógica matemática”, de 10/08/2018, publicado no jornal Estado de São Paulo, é um acinte. No mínimo, um jogo de palavras que se inicia no título, no estilo Bolsonaro de atacar com soluções simples e contundentes questões complexas, desqualificando conceitos e valores, em função de uma visão econômica e sem lógica alguma. A quem ele favorece? Informa de alguma maneira? Defende de forma contundente um governo agonizante?
O referido editorial contrasta o crescimento do número de instituições de Ensino Superior, realizado sob comando petista com a incrível derrocada da discussão sobre a reforma da previdência, e culpa agora os manifestantes pró-Capes, pela conivência com as ações dos governos passados, levando à tábua rasa cidadãos, governos e instituições.
Por mais que possa ser questionada, a edução superior é, por lei, responsabilidade do Estado.
Não se busca pelo melhor profissional para cuidar dos filhos e da família? O que dizer da educação? Numa sociedade que valoriza títulos, indispensáveis para concursos e promoções, parece importar pouco o que os jovens recebem como treinamento e formação e a que condições são submetidos. Por que razão deixaríamos nossos jovens entregues a um sistema desassistido?
Não foram poucos os que alertaram sobre o risco da criação, não planejada, de número enorme de universidades e de outras milhares de vagas nas universidades existentes, o que foi tido como “anti-ideológico” e como não técnico (ou matemático!)
Embora desejável, o aumento do número de vagas levou hoje a situações insustentáveis do ponto de vista financeiro, mas principalmente das condições de trabalho e a que se submetem os alunos ingressantes.
Passa-nos despercebido que o fracasso das negociações do atual Executivo aconteceu mesmo após uma gigantesca manobra sustentada por emendas parlamentares, distribuindo fundos importantes para os congressistas?
Passa-nos despercebido que há investimento de 1,7 bilhão de reais em verbas destinadas às campanhas eleitorais, e que a soma do que foi distribuído aos três maiores partidos políticos (MDB, PT e PSDB, com respectivamente 234, 212 e
185 milhões cada um) ultrapassa o corte sugerido de 580 milhões no orçamento
da Capes.
Não seria função do Ministério da Educação cuidar da educação em seus diversos escalões? Não seria função do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (sic) cuidar da Ciência e Tecnologia em seus diversos níveis?
Não seriam Capes e CNPq órgãos importantes das ações de um e de outro? Não é razoável que aqueles à frente destes órgãos se manifestem claramente quanto aos destinos de cada um, caso o orçamento se mantenha no presente formato?
Somos (teríamos sido) omissos ou prisioneiros de um sistema político falido e corporativista? A quem devemos apresentar nossas opiniões? A que se presta o tom revanchista do editorial do Estadão?
Do ponto de vista de quem trabalha com Ensino Superior e com a qualificação em nível de pós-graduação, a Capes é um bem nacional. Isto se dá não somente por providenciar o sustento para aqueles que estão em formação, mas por sustentar a fragilizada rede de pesquisa científica com a qual se imiscue.
Tentar proteger o que funciona bem ou o que precisa funcionar é tarefa nossa e deve ser levada aos responsáveis por estarem ocupando cargos políticos e executivos.
Neste sentido, só podemos estar alertas com a situação das nossas instituições, salientando a fragilidade da Capes, do CNPq e da Finep, além das Fundações Estaduais, mas principalmente das Instituições de Ensino Superior.
Todas elas são bens públicos e não apenas itens de dispendio dos diversos escalões nos diversos ministérios, que precisam ser adotadas como tais por todos os cidadãos, mas principalmente por aqueles que formam opiniões.
Enquanto questões básicas como a formação em nível superior for tratada como item negociável, estaremos fadados ao sub-desenvolvimento e terceiro-mundismo.