Reprodutibilidade na Ciência: uma notícia ruim… e várias boas

Heraldo Possolo de Souza
Faculdade de Medicina da USP

Primeiro a má notícia. Existe realmente uma crise de reprodutibilidade na Ciência. Francis Bacon, o fundador da Ciência Moderna, já apontava a reprodutibilidade como um dos pilares sobre os quais a verdade científica deve se apoiar. O método científico, desenvolvido desde então, postula que devemos formular uma hipótese, desenhar experimentos para confirmá-la ou refutá-la, analisar os resultados de maneira imparcial, inserir esses resultados no contexto do conhecimento atual e reproduzir esses experimentos.

E aí começam os nossos atuais problemas. A comunidade científica já identificou e assumiu, em artigos em revistas especializadas, que pesquisadores têm tido uma maior dificuldade em reproduzir experimentos de outros laboratórios. Isso é ruim.

Agora as boas notícias.

A comunidade científica (incluídos pesquisadores, instituições acadêmicas, agências de fomento e revistas especializadas) já se deu conta do problema. E iniciativas têm sido tomadas para sua correção.

Observa-se que é necessária a criação de padrões mais estritos para se realizar e relatar os experimentos. Linhagens de células em cultura necessitam ser caracterizadas de forma mais precisa; reagentes utilizados em laboratórios devem ser de melhor qualidade; e a criação e uso de animais para experimentação devem obedecer critérios éticos e de qualidade bastante rígidos.

Em estudos clínicos e epidemiológicos, o desenho experimental e as análises estatísticas precisam ser efetuadas e relatadas com a maior clareza possível. E o compartilhamento dos dados brutos deve ser incentivado em todos os estudos publicados.

Soma-se a isso uma nova diretriz adotada por algumas revistas especializadas que hoje já publicam resultados negativos, como por exemplo sobre droga que não produz efeito algum – algo que não acontecia há alguns anos. Além de oferecem maior espaço para que a metodologia seja descrita nos mínimos detalhes.

Algumas dessas medidas estão sendo adotadas no exterior. Aqui no Brasil, estamos engatinhando.

A Federação das Sociedades de Biologia Experimental e a Academia Nacional de Medicina organizaram, independentemente, reuniões semana passada, em São Paulo e no Rio de Janeiro, respectivamente, para discutir o assunto.

E as conclusões foram que estamos atrasados, mas ainda não perdemos o trem.

Precisamos adotar medidas para corrigir o problema no Brasil, e não podemos demorar.

Todas essas iniciativas, no entanto, serão paliativas. Os tempos mudaram e a Ciência precisa acompanhá-los. Se queremos entender melhor os fenômenos da Natureza e criar melhorias na qualidade de vida de seres humanos, há necessidade de uma Ciência mais compartilhada.

Os  cientistas precisam ter acesso aos mínimos detalhes do que seus pares estão fazendo, os resultados devem ser mais transparentes e as metodologias de pesquisa precisam estar disponíveis a mais pesquisadores.

Essas são medidas necessárias e devem ser incentivada pelas universidades, agências financiadoras e, principalmente , pelos próprios cientistas.

Acreditamos que estamos no alvorecer de uma nova era na Ciência, onde paradigmas em uso hoje serão abandonados. Haverá muita dificuldade, mas os resultados com certeza serão bastante compensadores.